segunda-feira, 31 de dezembro de 2001

O TROFÉU ROUBADO




Certo dia disseram a um grupo de  trabalhadores dedicados que eles poderi-am, quando de suas aposentadorias, ter uma qualidade de vida decente, vivendo uma tranqüilidade almejada por todos e por poucos alcançada àquela altura. Não era um sonho, e até muitos não entenderam bem o espírito da coisa.
Passaram-se os anos e tudo parecia correr às mil maravilhas, pois al-guns já desfrutavam do prometido, o que era um atestado do que antes lhes havia sido dito. Entusiasmo no trabalho, não faltou; argumentos para tanta euforia eram abundantes; a perspectiva de uma aposentadoria tranqüila e uma qualidade de vida decente, fascinava. Ninguém desconfiava de que “ dia de muito, véspera de pouco” não era apenas um provérbio, mas uma sentença. Não demorou, e o que era espe-rança, tornou-se desespero, intranqüilidade,  fantasma; tudo mudou e o que era sonho transformou-se em pesadelo; a almejada qualidade de vida decente era ape-nas uma quimera, uma utopia, talvez.
O pior de tudo isso é saber, é estar consciente, de que em nenhum momento se concorreu para esse estado de coisas. Recebemos, como se diz popu-larmente, um chute na canela; e que chute !
Aquele grupo de que falamos no início, continua coeso, mas em torno das suas incertezas,  desiludido das promessas que lhe fizeram há vinte e tantos anos atrás. Promessa de qualidade de vida decente tornou-se uma excrescência. O que vai sobrar de tudo isso é a certeza de que o trabalhador é  um herói das bata-lhas da vida, só que o troféu da vitória lhe é roubado ainda no pódio.

II  -  Trapos e sarjeta

Estamos todos reféns das especulações das leis e regulamentos e pior, das interpretações. Agora, estamos assistindo  às execuções, não pela forca, mas pelo bolso que, aliás, é a parte mais sensível do corpo humano e , por isso mesmo pior, porque vai matar devagar, devagarinho, como canta o sambista. É triste, muito tris-te, constatar que tudo isso acontece pela incúria e pelas decisões verticais tomadas à revelia dos participantes ludibriados e agora humilhados. Causa-nos vergonha ser tratados como tendo praticado dolo, fraude, emitido declaração falsa, ou outro crime afim, quando na realidade fomos e somos vítimas da vaidade e das manobras que culminaram com tudo o que aí está.
Defesa, argumentos, não são aceitos. Em nome da lei e de um regulamento capcioso, somos jogados na sarjeta, como trapos, como criaturas que se locupleta-ram da Fundação, como foi dito em carta enviada a grande parte dos nossos cole-gas, enquadrados em processo administrativo instaurado por um dos Interventores na Fundação. Pena que direito adquirido e injustiça signifiquem a mesma coisa nessas horas. Estamos diante de uma herança maldita que fomos levados a julgar ser o horizonte brilhante das nossas vidas. Puro engano. Estamos sendo tratados como lixo, sem direito a reciclagem. Lixo sim, porque estamos sendo condenados ao abandono, às moscas, sem nenhuma consideração por quem tem a obrigação legal de nos proteger. Estamos sendo jogados à própria sorte, sem rumo, sem dire-ção, sem oportunidade de recuperação.
Certa vez, há muitos anos passados, um líder sindical rebatendo as críticas patronais de que a classe que ele representava vivia bem, porque andava de paletó e gravata e morava em apartamento, desabafou: não sabem eles, os patrões,  que a gravata nos enforca e a nosso apartamento é a antecipação do nosso túmulo. Não é diferente a situação para a qual  estão nos empurrando. Com as nossas desculpas pelo humor negro, por pouco, o tal  artigo do Regulamento, o 23, não nos estigmati-zou com a marca do ridículo. Também assim, seria demais.

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